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”Renunciar jamais. Eu não aceitarei pressão e nunca irei renunciar”, diz prefeita ameaçada de Cachoeira

“O desafio é o que nos move e cada vez que nós sofremos esse tipo de ataque nós temos a convicção realmente que não vão retroceder”.

Primeira mulher eleita para gerir a cidade de Cachoeira, a republicana Eliana Gonzaga ganhou os holofotes na última semana após as ameaças de morte que ela passou a sofrer, após dois aliados seus serem brutalmente assassinatos no município. Amedrontada e andando com escolta policial, ela diz que tem ”vivido dias difíceis e conturbados”, mas que não sucumbirá às pressões e que não renunciará ”jamais”, como querem seus algozes. ”Eu não aceitarei pressão e nunca irei renunciar”. De acordo com a prefeita, o que “está acontecendo na cidade revoltou a população cachoeirana”. E destaca que vai continuar trabalhando ”em todas as áreas para mudar a realidade de Cachoeira”. Confira:

A senhora tem sofrido ameaças desde que se elegeu prefeita de Cachoeira. Mas só depois que o Jornal A Tarde noticiou o caso ele passou a ganhar novos capítulos. Como a senhora tem vivido esse momento?

Na verdade, nós temos vivido dias difíceis e conturbados. Contudo, isso não nos deixa desistir jamais. Muito pelo contrário. O desafio é o que nos move e cada vez que nós sofremos esse tipo de ataque nós temos a convicção realmente que não vão retroceder. Porque retrocesso só nos leva à queda, na verdade. E nós precisamos avançar. Nós precisamos fazer uma política positiva. Temos recebido apoios cada vez maiores de grupos de mulheres, de negros, movimentos sociais, da Assembleia Legislativa, da Câmara de Deputados, do Senado, da UPB, alem dos próprios veículos de comunicação que, desde que vieram à tona as ameaças, através da primeira notícia divulgada pelo Jornal A TARDE, é que realmente o caso tomou uma dimensão maior. Eu quero, inclusive, agradecer à equipe do Jornal A TARDE, a Levi Vasconcelos, que teve um olhar cuidadoso e conseguiu captar essa situação que Cachoeira está vivendo. Porque estava no mundo da invisibilidade. Nós estávamos passando tudo isso desde quando saiu o resultado das eleições. Porque Ivan Passosfoi foi assassinado dois dias após as eleições, e o Georlando Silva, no dia 7 de março, mas tudo isso estava apenas no perímetro municipal. E, através desse primeiro passo que o Jornal A Tarde deu foi que começou a ter essa grande repercussão. Todos os outros veículos de comunicação e começaram a se posicionar e a chegar às m manifestações de solidariedade. Graças a Deus as autoridades tomaram atitudes mais severas para estarmos chegando à elucidação dos fatos. E eu creio na justiça de Deus, na justiça também aqui da Terra, que tudo isso será resolvido. E as autoridades chegarão aos responsáveis de fato e que eles sejam punidos.

Como se deram essas ameaças, prefeita?

Vejamos. No dia 17 de novembro, ainda do ano passado, logo após o resultado das eleições, o Ivan Passos foi assassinado com 10 tiros. Coincidência ou não, foram 10, o número que representa o meu partido. E a partir desse dia, nesse mesmo dia, se instalou um clima de terror na cidade, onde todos tiveram conhecimento de uma suposta lista onde constavam diversos nomes de militantes que aderiram ao projeto coletivo por uma Cachoeira livre. E nessa suposta lista, diziam que Georlando seria o segundo a ser assassinado, como de fato foi no dia 7 de março. Ele foi o segundo da lista. E também eu recebi uma ligação, quando eu atendi o celular foi uma rajada de metralhadora. Eu fui e prestei uma queixa na delegacia local e a delegada deixou claro que isso era um ato de ameaça explícita. Porque ninguém recebe uma ligação e quando atende é uma rajada de metralhadora. O que isso vem a dizer? Diante de um assassinato de um militante político e diante de uma suposta lista que todos na cidade têm conhecimento, inclusive, de que nessa lista também constava o meu nome, o nome do meu filho, o nome do meu marido… E nesse mesmo dia do assassinado do Ivan Passos eu tive que tirar diversos militantes do município para trazer para a região metropolitana. A partir daí o Georlando se sentiu mais ameaçado ainda, desde que começou a fazer parte da nossa gestão na coordenação da Secretaria de Obras. Ele sempre foi muito aguerrido, destemido, inclusive tem um vídeo dele, onde diz que está sendo vítima de ameaças e que ele não teme a morte, e que essas ameaças se dão por ele ter abraçado um projeto de uma Cachoeira livre. Corre um boato na cidade, nos bares, nas ruas, no supermercado, aonde você anda você ouve esses comentários. Que nós não teremos paz para governar, que essa lista existe e que ainda tem muita gente para morrer. Esse tipo de terror. E ainda tem pessoas que chegam para a gente e dizem “olha, eu estou sabendo que se você renunciar tudo isso acaba. Você tem que renunciar para acabar com essa matança”. Esse tipo de conversa que nós sabemos que são recados que são passados para poder estar circulando e chegar até a gente. Mas renunciar jamais. Eu não aceitarei pressão e nunca irei renunciar.

A senhora acredita em motivação política para isso, prefeita?

Olha, eu não posso lhe dizer quais são os motivos. Eu nunca tive inimigos, diga-se de passagem, tudo se deu a partir do resultado das eleições, isso aí eu posso lhe garantir. Porque se isso nunca aconteceu comigo, nem com ninguém da minha família, nem com nenhum militante político que nos apoiou, e só começou a surgir isso, essas ameaças, esses crimes, esses assassinatos. Porque assim, não são apenas ameaças, após a eleição. Porque não ficaram apenas no campo das ameaças, pois já houve dois assassinatos brutais. Tanto que Georlando tomou 19 tiros todos no rosto brutalmente. Foi uma brutalidade, foi muito monstruoso. Esse crime foi uma barbárie. Os dois foram, mas o de Georlando foram todos no rosto, desfigurou o rosto do rapaz todo. E no vídeo ele fala que o recado que chegou até ele diz que se ele não parasse, que iam fazer uma coisa que iria chocar a cidade. Foi de uma brutalidade tamanha que realmente chocou a cidade. Tanto que depois tivemos também que tirar outras pessoas, pessoas que já foram embora da cidade. Eu não estou dormindo na minha casa, nem eu, nem minha família, a gente fica nesse “sobe e desce” que é muito inconveniente, é muito estressante. E eu vou lhe dizer, é muito injusto, é a palavra que a gente consegue descrever. É uma injustiça tamanha, porque não cometemos nenhum tipo de crime para a gente estar corrido da nossa casa, da nossa cidade.

A senhora teve uma reunião essa semana com o secretário de segurança pública, está andando com escolta policial e, como a senhora mesma relatou, tem dormido fora da sua residência. A senhora teme pela sua vida e pela vida de seus familiares?

Sim, porque disse que nessa lista tem o meu nome, o nome do meu marido e o nome do meu filho, fora os nomes de muitos militantes políticos nossos. Eu vou lhe dizer, eu temo mais pela vida dos meus militantes, dos nossos militantes, e dos meus familiares do que pela minha própria vida. Porque se chegar a me atingir diretamente, eu não vou mais estar aqui para ver e sofrer. E aí é uma tortura você ver uma pessoa, um cachoeirano ou uma cachoeirana, independente dos laços consanguíneos, ser abatido de forma brutal e covarde. É muito triste. Então assim, é inexplicável, se faz necessário, em caráter de urgência, que esses crimes sejam elucidados e que não apenas o que puxa o gatilho seja punido, mas o mandante ou os mandantes.

A senhora já foi vereadora e tem um trabalho sindical de mais de 30 anos. A senhora já recebeu muitas ameaças racistas, prefeita?

Sim. Muitas ameaças. Mas você sabe que a veia que pulsa no cachoeirano da ancestralidade, a veia dos antigos guerreiros que deram o primeiro grito da independência da Bahia e do Brasil aqui, na terra de Cachoeira, porque o nosso primeiro grito de independência foi em Cachoeira, como todos conhecem a nossa história. E a minha veia sindicalista, eu já estou acostumada a fazer enfrentamento com fazendeiros para garantir o direito à terra dos agricultores, já estou acostumada a ir para frente de fuzil, de escopeta. Então isso para mim não é novidade, fazer enfrentamento. Mas quando trata-se de outras vidas, diretamente, quando se trata de duas vidas que já perdemos, o temor por essas vidas que possam vir a ser ceifadas. O que não é justo, o que não é correto, o que não está dentro da legalidade e da moralidade da política, o que está fora da ética política. Então a gente não pode se calar. Inclusive, tem pessoas que continuam querendo nos calar, fazendo publicações em redes sociais, colocando em dúvida a existência dessas ameaças. E as vidas que se foram, como ficam? E a ligação que eu recebi com uma rajada de metralhadora, que eu registrei a queixa e lá no registro da queixa, na ocorrência, tem o número do celular que está sendo investigado? Tudo isso são fatos ou são ficção?

Qual o diagnóstico que a senhora faz da cidade de Cachoeira hoje?

Nós estamos fazendo a redemocratização na política cachoeirana. Nós estamos deixando a velha política para trás. Nós estamos reconstruindo um novo caminho para Cachoeira.

Quais os serviços devem ser colocados como prioridade pelos próximos quatro anos?

Veja bem, nós queremos priorizar sobretudo a questão da saúde. Uma saúde humanizada, com uma qualidade melhor. Nós estamos passando por um momento muito difícil, que é esse momento pandêmico, contudo, nós estamos aplicando diversas ações no combate à Covid-19. Vamos realizar um convênio com o único hospital do município, que é o Hospital São João de Deus, da Santa Casa de Misericórdia da Cachoeira. Nos vamos implantar uma política de saúde voltada para as mulheres, para aquelas pessoas que têm anemia falciforme, uma política especial de saúde voltada para o idoso, nós vamos também fazer um trabalho muito forte na agricultura familiar que é a indústria natural, vamos fomentar, no momento pós-covid, o turismo náutico. Inclusive já recebemos o georreferenciamento na semana passada, na segunda-feira passada, das mãos do secretário de turismo, Fausto (Franco), o georreferenciamento do Rio Paraguaçu, onde nós vamos aplicar diversas modalidades de esportes náuticos. Nós vamos fazer o turismo rural. Vamos trabalhar também do fortalecimento do artista local. No momento, não podemos fazer nada por conta dessa pandemia, mas nós vamos trabalhar muito forte a questão da valorização de todos os artistas, do samba de roda, a questão das diversas modalidades culturais, as nossas tradições, as nossas festas, a questão da festa de Nossa Senhora da Boa Morte, a questão do fortalecimento aqui da Flica, para a gente estar atraindo um público maior, embora não seja nada agora por conta do que eu já lhe disse, a pandemia.

A senhora é filiada ao Republicanos. Como tem sido a relação com o governador Rui Costa do PT?

Quando se trata de priorizar o bem da coletividade, isso perpassa essa questão de política em si, de sigla partidária. O que nós precisamos, as autoridades precisam, os políticos precisam é se unir em prol de uma causa em comum. Em prol do bem comum do cidadão. Porque é para isso que nós, políticos, somos eleitos. Independente de sigla ou de bandeira partidária. E a relação nós temos encontrado.

A pandemia também trouxe o agravamento da crise financeira e o aumento no número de desempregados, que passou a depender mais do auxílio emergencial. Esses valores novos atendem à demanda da população ou esse cenário preocupa?

Não deixa de preocupar. Porque uma vez que as pessoas estão desempregadas e o valor do auxílio emergencial cai, você sabe que as dificuldades para essas famílias aumentam. Ainda assim, o município de Cachoeira tem uma certa habilidade de contornar essa situação, tendo em vista também a grande parcela de agricultores familiares, e eles provêm a sua própria renda através da agricultura que é muito forte no município. Mas, ainda assim, não supre todas as necessidades. E aí o próprio sindicato dos trabalhadores rurais, nós vamos estar também fortalecendo o sindicato através de financiamento rural, de buscar mais parcerias, do fortalecimento das parcerias com os bancos, o Banco do Nordeste, o Banco do Brasil, através de financiamentos rurais para aquecer a economia da agricultura familiar e, a partir daí, melhorar a independência economia desses agricultores. Vou continuar trabalhando diuturnamente pela população de Cachoeira.

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Foto: Divulgação

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