O principal argumento de oficiais generais ouvidos pelo Estado é o de que turbulência política misturada com crise sanitária tem potencial para causar ainda mais problemas ao País
A tática de confronto estabelecida pelo presidente Jair Bolsonaro com os governadores causou incômodo nas Forças Armadas. Embora considerem correta a preocupação de Bolsonaro com os efeitos da quarentena estabelecida para combater o coronavírus na economia, os militares discordam e até condenam a guerra travada por ele com os chefes dos Executivos estaduais.
O principal argumento de oficiais generais ouvidos pelo Estado é o de que turbulência política misturada com crise sanitária tem potencial para causar ainda mais problemas ao País. Até mesmo na ala militar do governo há críticas a atitudes tomadas por Bolsonaro, que vem subindo o tom no embate com governadores, especialmente com João Doria (São Paulo) e Wilson Witzel (Rio). “Essa atitude só serve para enfraquecê-lo e isolá-lo”, disse um general, sob a condição de anonimato.
Militares da ativa são proibidos de dar declarações políticas pelo Regimento Disciplinar das suas respectivas forças. Mas as conversas sobre o comportamento do presidente no cruzamento da crise política com a sanitária têm sido frequentes nos grupos de WhatsApp integrados pela cúpula militar. O assunto também faz parte de reuniões que os Altos Comandos das Forças Armadas realizam informal e virtualmente.
De acordo com militares consultados pelo Estado, a briga política que tomou conta do País, aliada a uma tentativa de diversos segmentos de enfraquecer o presidente, são ingredientes considerados perigosos. Para eles, não é o momento para se discutir esse tipo de assunto porque é necessário deixar as diferenças políticas de lado e trabalhar na busca de soluções para a pandemia e as suas consequências.
Nos bastidores, todos avaliam, porém, que o comportamento do presidente e a insistência dele em manter a tensão política, além da introdução de seu filho 02, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC), em reuniões importantes, não passam uma boa mensagem. Foi como se o governo tivesse criado uma autoridade “não institucional” que participa de decisões governamentais. Carlos comanda o chamado “gabinete do ódio” na avaliação de diversos interlocutores do presidente, e tem ajudado a manter o estilo beligerante do presidente.
Os militares querem que Bolsonaro retome a liderança do processo de condução do combate ao covid-19. “A liderança tem de ser do governo, que tem de ter recursos financeiros para ajudar os estados e a população e a comunicação tem estar afinada entre todos os segmentos, para que não se passe insegurança à população”, disse ao Estado o ex-ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ao resumir um sentimento existente na Forças Armadas.
Santos Cruz elogiou a atuação dos ministros e apelou para que os discursos sejam “mais equilibrados”, referindo-se indiretamente a Bolsonaro. Para o general, reunião entre governadores e presidentes não podem ser abertas para que não se transformem em palcos de divergências política. Para o general, o momento é de agir em conjunto com os governadores.
Outros militares ouvidos pelo Estado temem o “isolamento federativo” do presidente, que consideram negativo neste momento em que a população quer ver uma soma de esforços para sair da crise e não troca de acusações que têm como pano de fundo uma antecipação da discussão da disputa eleitoral de 2022.
Por isso, recomendam que Bolsonaro promova um diálogo franco com os governadores. Na avaliação desses militares, a população não gosta do confronto e quer ver o seu chefe maior assumir as rédeas do comando do País. Dizem, ainda, que, querendo o governo ou não, a conta da crise do coronavírus cairá no colo de Bolsonaro e ele pagará o preço de suas atitudes nas eleições de 2022.
Entre as ações de liderança pregadas por militares que conversaram com a reportagem está a necessidade de medidas efetivas em favor da população mais carente, que mais vai sofrer com a pandemia.
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A Voz da Bahia/Foto: Dida Sampaio/Estadão