ACM Neto (UNIÃO) e Jerônimo Rodrigues (PT) articulam com gestores de siglas adversárias para fortalecer arco de alianças.
Era final de março, quando o prefeito da pequena cidade de Gongogi, no sul da Bahia, Adriano Mendonça, do PSD, subiu no palanque do governador Rui Costa e bradou: “Pode ter certeza que, se Gongogi for agraciada, o senhor vai ter um soldado honesto ao seu lado. Um soldado que vai lutar 24 horas por dia para fazer Jerônimo Rodrigues governador desse município e da nossa Bahia”.
O discurso veemente perdeu ressonância, no entanto, menos de um mês depois — exatos 24 dias. Adriano Mendonça subiu novamente em um palanque, mas, desta vez, do pré-candidato do União Brasil, ACM Neto. Sem qualquer constrangimento na ‘virada de folha’, acusou o governo Rui de usar a “máquina pública para correr atrás de votos”. “Tem de abraçar o povo nos quatro anos da administração e não às vésperas das eleições. Agora não adianta prometer mais nada”, disse ele.
Rui reagiu com ironia: “Só posso dar risada e achar engraçado”. A disputa pelo Palácio de Ondina neste ano virou uma corrida ferrenha pelos prefeitos. Os candidatos a governador fazem questão de divulgar os apoios que receberam de gestores municipais de partidos adversários. O embate pelo valorizado “passe” envolve conversas, promessas de obras, caso eleito, e muita troca de farpas.
ACM Neto diz que o governador tem prometido até “pedaços de terra na lua” para ter os apoios, e aposta que, após a torneira de recursos estaduais fechar, haverá uma migração de administradores municipais para sua base política. Pela lei eleitoral, fica vedada o investimento em obras públicas até três meses antes do pleito.
“Vai vir muito prefeito do PT para cá, para o nosso lado. Nós vamos ganhar essa eleição no primeiro turno”, disse o aliado do ex-prefeito soteropolitano, João Leão (PP), que é pré-candidato a senador.
Neto já anunciou ter apoio de, pelo menos, três prefeitos de siglas oponentes. Além de Adriano Mendonça, estão na lista: Adilson Leite (Avante), de Jandaíra, e Dr. Adriano (PSB), de Mundo Novo. Antes de o PP migrar para a sua base, ACM Neto também divulgava apoio de gestores desta legenda. Agora, são os governistas que declaram que os prefeitos do PP estão fechados com Jerônimo, mesmo após o rompimento político da sigla com o grupo.
Um dia depois de Leão deixar a base de Rui, o governo informou que quatro prefeitos do PP participaram de um evento do governador em Almadinha, no sul baiano. Estavam presentes: Juraci, de Barro Preto; Jadson Albano, de Coaraci; Dr. Marival, de Nova Canaã e Paulo Rios, de Itororó. Era uma demonstração de que o ala governista se mantinha forte, com apoio de prefeituras, apesar do racha.
Além de pepistas, a campanha de Jerônimo Rodrigues também divulgou apoios de prefeitos da base de ACM Neto, como Keinha de Jesus (PDT), de Araci, e Nandinho da Serraria (PSDB), de Esplanada. Do PL, partido do pré-candidato João Roma, também fisgaram Mauro Vieira, da cidade de Anguera.
BASE DE APOIO
O cientista político e professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Maurício Ferreira Silva, explica que o “passe” dos prefeitos é valorizado na campanha porque eles são o principal elo entre os candidatos a governador e os eleitores.
“Os candidatos do Executivo estadual ou federal podem chegar diretamente ao cidadão. Não tem problema. O problema é ele manter essa base fora da alçada da Câmara de Vereadores e da Prefeitura. Não é impossível, mas é mais difícil. Quando você tem uma base partidária, um grupo de apoio, dentro daquele município, que dialoga com os poderes locais, se consegue ter a pujança de um movimento político dentro da localidade. Se não tiver isso, fica uma coisa esporádica e ocasional. As candidaturas tendem a ir esfriando e perdendo força. Quem faz a campanha são os militantes que já estão no município. Não é estrutura que surge do nada. Essa militância, esse poder local é que consegue dar o dinamismo e visibilidade às campanhas”, disse ele.
Na semana passada, o governador Rui Costa, em entrevista à Rádio Metrópole, admitiu que tem se empenhado para atrair prefeitos. “Estou atendendo prefeito atrás de prefeito. Semana passada, eu fiquei até duas da manhã atendendo prefeito”, revelou. “A minha mulher diz: ‘ele não trabalhou tanto em 2014 e 2018 como está trabalhando agora. De fato, eu estou. Quando você não é candidato, eu não tenho agenda de candidato, dá mais tempo para você trabalhar na articulação, na preparação. Ouve mais e articula mais. Agora, estou botando candidaturas nas principais cidades onde está vazio para preencher e fortalecer a chapa”, acrescentou.
Estima-se que, para garantir os apoios nas localidades a campanha de Jerônimo Rodrigues, o governo estadual tenha liberado cerca de R$ 1 bilhão em convênios.
O cientista político e professor da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Cláudio André, ressalta que ter o maior número de prefeitos, por si só, não garantirá uma vitória eleitoral. “Mas é um dos indicadores de viabilidade eleitoral, já que umentam as chances de as lideranças trabalharem efetivamente pela vitória do candidato ao governo.
Por conta do federalismo brasileiro assegurar pouca capacidade das prefeituras em gerar investimentos, qualquer prefeito sabe o peso decisivo para a sua gestão ter um governador aliado, logo, há um envolvimento dos prefeitos de olho no cálculo político para a reeleição ou eleger um sucessor dois anos depois”, analisou.
Mas o apoio do prefeito é capaz de mudar o voto do eleitor? “No geral, a ciência política comprova a prevalência do prefeito como uma das principais lideranças na definição do voto. Ainda mais em estados como a Bahia, onde uma parte significativa dos municípios são pequenos e vivem dos recursos do Poder Executivo”, diz Cláudio André.
Maurício Silva ressalta ainda que muitas vezes o gestor municipal “trai” o candidato a governador do seu partido. “O apoio não é automático, porque o interesse local pode se sobrepor ao interesse político dos partidos”, pontua.
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