Ameaças de ataques mobilizam ações preventivas de autoridades de segurança e educação.
Ao menos nove adolescentes já foram apreendidos pela Polícia Civil em Salvador e no interior do estado por possível envolvimento e propagação de ameaças de ataques contra escolas. Nessa terça-feira (11), durante a Operação Escola Segura, desenvolvida para prevenir e reprimir ataques nas instituições de ensino em todo o país, equipes da Polícia Civil apreenderam cinco adolescentes em Juazeiro, Iaçu, Maiquinique, Paratinga e Itapetinga. Outros quatro confirmados pela pasta foram apreendidos nos municípios de Salvador, Ituberá, Vitória da Conquista e Itarantim na segunda-feira (10).
De acordo com Delmar Bittencourt, coordenador do Laboratório de Inteligência Cibernética da Polícia Civil (Cyberlab), é possível que o número de apreensões seja ainda maior. “Tem outros casos, mas ainda não compilamos os dados de hoje [ontem]. A quem está disseminando boatos de ataque nós estamos levando busca e apreensão nas residências e levando a unidade da polícia para analisar qual é o teor da mensagem e responsabilizar pelo crime praticado”, afirma o delegado.
Por conta das ameaças e ataques pelo país, as escolas, em Salvador, estão se mobilizando para reforçar a segurança dentro e fora das suas dependências. O Colégio Oficina, na Pituba, fez um comunicado relatando aos pais e alunos que deu início ao contato com a Polícia Militar para reforçar a necessidade de ampliação da Ronda Escolar. O colégio já conta com sistema interno de câmeras, catracas de identificação de acesso por biometria e grupo de brigadistas treinados para emergências, que, inclusive, foi reforçado.
Já o Colégio Antônio Vieira, no Garcia, acionou o Comitê Interno de Gerenciamento de Riscos e anunciou a ampliação das medidas gerais de segurança, como diálogos com as autoridades de segurança estaduais, maior controle de acessos, requalificação das barreiras físicas e reforço do treinamento da equipe de segurança.
Em comunicado, o Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado da Bahia (Sinepe-BA) indicou que vem propondo maior atenção aos humores e comportamentos atípicos de pessoas da comunidade escolar e orientou que todos tenham em mãos o telefone do Samu (192), Polícia Militar (190), Ronda Escolar e Corpo de Bombeiro (193) e identificação daqueles que acessam a instituição de ensino. Incentivou ainda o diálogo e a manutenção dos portões fechados nas unidades.
Sem dispor dos mesmos recursos de segurança, as escolas da rede estadual tiveram o policiamento reforçado em alguns locais do estado, como Porto Seguro e a capital, para assegurar a entrada e saída de alunos, pais e professores.
Em Lauro de Freitas, na região metropolitana, a Secretaria Municipal de Educação solicitou apoio à Guarda Municipal e à Polícia Militar para averiguar boatos e aumentar a segurança nas escolas. A medida conta com a disponibilização do efetivo da ronda escolar em um plano de ação preventiva. Segundo a Prefeitura, ainda é estudada a possibilidade de implementação de uma força-tarefa e segurança nas escolas públicas e privadas do município.
Monitoramento
Para realizar o controle de ameaças de ataques contra escolas, a Polícia Civil está trabalhando junto ao Ministério da Justiça e à Secretaria de Segurança Pública (SSP) para fazer buscas nas redes sociais e checagem de denúncias. Até o momento, no entanto, não há estimativa de quantas denúncias foram feitas ou quantos boatos foram analisados.
Segundo o delegado Delmar Bittencourt, o processo de monitoramento de possíveis suspeitos começa quando a Polícia Civil recebe a informação de ameaça. A partir daí, as equipes fazem um filtro para saber se o compartilhamento é da Bahia ou de outro estado.
“Se for na Bahia, analisamos todas as características e, se entendermos que é necessário dar seguimento às investigações, em um trabalho de inteligência maior, nós chegamos até os autores”, detalha.
Quem estiver encaminhando informações falsas com intenção suspeita de cometer crime é identificado e a Polícia Civil pode fazer busca e apreensão para localizar armas, apreender dispositivos e verificar se há uma rede por trás das ameaças.
Para auxiliar as forças policiais, o Ministério da Justiça abriu um canal de comunicação para receber denúncias de todo o país. Procurada, a pasta informou que as denúncias recebidas estão sendo tratadas por uma equipe de policiais e, dependendo da gravidade, os encaminhamentos são direcionados à polícia local ou à unidade respectiva que tem atribuição para investigação do fato e suas circunstâncias. Por questões de segurança, o Ministério da Justiça disse que nem os números nem os locais da denúncia serão divulgados.
A Polícia Militar da Bahia foi procurada para saber se há ação articulada para todo o estado e quais municípios acionaram o policiamento militar para reforço da segurança nas escolas, mas não respondeu às duas tentativas de contato feitas pelo CORREIO até a publicação desta matéria.
Políticas públicas
Em nota, a Secretaria da Educação do Estado (SEC) não soube quantificar quantas ameaças já chegaram às escolas da rede, mas informou que, ao serem identificados, os supostos casos de ameaça são imediatamente comunicados à Secretaria de Segurança Pública (SSP). Em conjunto, as duas pastas disponibilizaram um canal através do 181 para a comunicação de possíveis ameaças.
As informações serão tratadas de maneira emergencial pela Superintendência de Inteligência e, imediatamente, repassadas para as forças policiais, visando a pronta resposta, quando cabível. Fotos, prints e vídeos também podem ser enviados através do site do Disque Denúncia.
Em Salvador, a Secretaria Municipal da Educação (Smed) disse que ainda não foi identificada nenhuma ameaça de ataque escolar, mas o assunto já entrou no radar. “Estão repensando em um planejamento estratégico para inibir todo e qualquer tipo de violência que venha ocorrer nas unidades escolares. Dentre as ações constam a realização de palestras e discussões com o objetivo de esclarecer para a comunidade escolar as consequências de tais atos”, diz trecho da nota.
Ainda nessa terça-feira (11), um projeto de lei protocolado na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) propôs a obrigatoriedade na instalação de portais de detecção de metais no acesso às unidades públicas de ensino. No texto, o deputado proponente, Patrick Lopes (Avante), que integra a base governista, destaca a realização de revistas a estudantes, funcionários ou visitantes, se necessário.
Como lidar com o medo
Diante de uma situação adversa que causa tumulto e pânico é quase impossível manter a calma, prever onde a situação está instaurada e até onde tem uma ‘fake news’ causada pelo medo. É o que aponta a psicóloga clínica Ingrid Nayan ao abordar o sentimento inevitável que muitos pais, alunos e professores estão vivenciando nas últimas semanas com as ameaças de ataques às escolas.
Para ela só há um caminho a ser percorrido. “Primeiro passo é o acolhimento. É mostrar para a criança que, apesar da situação pontual, a escola ainda é um lugar seguro e que, juntos, eles [família e criança] vão passar por essa adversidade, com o auxílio de psicólogos e a ronda escolar e aumento do esquema de segurança nas escolas”, afirma.
O ataque à escola em Barreiras, no Oeste da Bahia, que terminou com uma estudante cadeirante morta em setembro do ano passado, ou mesmo os boatos de possíveis outros ataques são parte do dia a dia da professora Karla Daniela Cupertino. Há 32 anos lecionando, ela descreve o momento atual na sala de aula como “tenso, incerto e com uma agitação além da própria de uma escola”.
“As alunas e alunos têm trocado informações que circulam pela internet, informações que não sabemos de onde surgiram, com muito medo, muitos não querem ir para escola e alguns já não compareceram hoje [ontem]. Os boatos crescem numa proporção que não conseguimos dar conta”, lamenta.
Ainda de acordo com a psicóloga Ingrid Nayan, para acalmar a crise, o medo e o pânico instaurado, sobretudo no caso de crianças, é preciso desviar o foco. Para isso, o controle emocional dos adultos é extremamente importante e deve ser trabalhado porque tem impacto direto sobre as crianças.
Pai de uma aluna do Colégio Antônio Vieira, que preferiu não ter seu nome divulgado, conta que busca adotar sempre a tranquilidade diante das informações sobre ameaças de ataques nas escolas para não assustar a filha. Para ele, como a maioria dos ataques tem os alunos como autores, as medidas a serem tomadas devem passar pela educação escolar.
“Acho que é melhor um acompanhamento da saúde dos alunos e dos professores do que qualquer tipo de parafernália de segurança que corresponde mais a um anseio de aumentar o policiamento, que já vimos em outros países, como os Estados Unidos, e que não funciona”, defende.
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Correio/Foto: Haeckel Dias/ Ascom-PC